saiu no jornal O Estado de SP, caderno Link, pág. 7, de 24/04/06
tem uma entrevista com o Richard Stallman no fim
Porto Alegre discute software livreCerca de 3 mil pessoas foram à capital gaúcha na semana passada para debater a democratização da tecnologia
Cidadania
SÍLVIO FERREIRA
O motorista de táxi contornou o assunto, mas não se conteve e engatou a pergunta: o que este monte de cabeludos e barbudos está fazendo em Porto Alegre? Mais de 3 mil pessoas, capitaneadas pelo guru do mundo alternativo da computação, Richard Stallman - um norte-americano de cabelos desgrenhados e longa barba - participaram na semana passada do 7º Fórum Internacional de Software Livre (Fisl). O evento terminou no sábado na capital gaúcha.
Embora em menor proporção que em edições anteriores do fórum, os 'freaks' (excêntricos) da computação ainda formam um grupo significativo. 'O movimento amadureceu. Muitos estão trabalhando em empresas', diz Cláudio Gediel, de 48 anos, analista de sistemas da Companhia de Processamento de Dados do Estado do Rio Grande do Sul (Procergs).
Lançada por Stallman nos anos 80, a idéia por trás do software livre propõe o desenvolvimento conjunto de programas para computador por pessoas de todo o mundo. Diferentemente do software proprietário, criado por empresas que mantêm os direitos sobre o código e suas versões, um aplicativo livre pode ser instalado, melhorado e redistribuído por qualquer usuário. 'A sociedade da informação, do conhecimento, tem parâmetros que ultrapassam os da sociedade de consumo tradicional', explica o professor da Universidade Complutense de Madri, Javier Bustamante, de 45 anos.
Ele defende a democratização da informação, da tecnologia e também do conhecimento. 'É preciso romper os monopólios e fazer da ciência e da tecnologia patrimônios da humanidade.' Durante o Fisl, Stallman apresentou o esboço da terceira versão da General Public License (GPL) - que definirá, entre outras coisas, a relação do software livre com sistemas de gerenciamento de direitos autorais. 'É uma atualização para o contexto tecnológico do Digital Rights Management (DRM), uma espécie de gerenciador de direitos digitais', destaca Felipe Sanches, de 22 anos, estudante de engenharia eletrônica da Universidade de São Paulo (USP).
Sanches é mais um insatisfeito com a forma como é tratado o termo 'hacker' pela mídia. 'A palavra vem do verbo ´to hack´, que quer dizer ´cortar, abrir caminho´ por um pesquisador, estudioso do assunto - não um criminoso. Este evento aqui, por exemplo, está cheio de hackers', assegura. Como bom adepto do software livre, o professor Javier acrescenta: 'Para o hacker, a informação é e deve ser livre. Quem faz a pirataria informática é o ´cracker´', afirma.
SAIBA MAIS SOBRE O FISL ONDE ACHAR INFORMAÇÕES
NOTÍCIAS | Cobertura Wiki
WEB | http://twiki.softwarelivre.org/bin/view/CoberturaWiki/WebHome
DETALHES | Textos sobre as palestras e debates escritos pelos participantes do Fórum Internacional de Software Livre, em sistema colaborativo (como na Wikipédia)´Queremos formar cidadãos livres´
ENTREVISTA
RICHARD STALLMAN, Pioneiro do software livre
Se quiser trocar alguma idéia sobre software livre com Richard Stallman, não ouse falar em Linux. 'O mais apropriado é dizer GNU/Linux', adverte. 'O Linux é apenas o kernel (núcleo) do sistema operacional, o código que faz a conexão entre as diferentes partes do computador, o hardware e o software, para o GNU.' Acomodado em uma poltrona no Centro de Convenções da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul, na quinta-feira, ele tirou os sapatos e, de meias sobre o carpete, deu a seguinte entrevista:
Por que os sistemas operacionais emsoftwarelivrenãochegamamuitos usuários residenciais hoje?
Porque as grandes empresas ainda usam o software proprietário. É o poder econômico. Quando os governos, as escolas públicas passarem a utilizar software livre, o quadro sofrerá uma transformação.
Isso já está mudando. Cada vez mais crianças no mundo estão sendo alfabetizadas na linguagem do software livre.
Vamos formar uma nova geração de usuários, de cidadãos livres. Grandes fabricantes de micros não querem cooperar conosco. Mas com o crescimento do uso de softwares livres, em razão da maior escala de consumo, serão obrigados a rever a posição.
Executivosde empresas comoaMicrosoft dizem que os softwares livres são clones de programas proprietários. Como vê essa questão?
Sim, é verdade. Mas é difícil comparar propostas tão distintas. Para nós, o aspecto mais importante não é este, mas o respeito ao usuário - não é o caso do software proprietário, que impede o acesso ao código-fonte. Nossa tarefa é acessar, mudar, distribuir e melhorar o código-fonte. As grandes empresas buscam o monopólio. Nós queremos compartilhar informações, disseminá-las.
Qual o risco de países em desenvolvimento como o Brasil continuarem a adotar softwares proprietários na maioria dos computadores?
O software proprietário é um perigo para todos. Seus desenvolvedores têm poder para introduzir funções de vigilância, restrições. É a computação traidora. Existem aqueles que resistem a isso. Outros, não...
Como o software livrepode ajudar a reduzir a exclusão digital?
Existem três fundamentos básicos: computador, software e conexão. Nós só não podemos intervir na conexão. Nos demais, sim. Podemos ter um hardware mais amplo e funcional e um software livre, gratuito, em um micro menos potente - e mais barato. Mas acredito que o principal é a liberdade.
Qual é o principal objetivo da revisão da licença GPL?
Não vai mudar muita coisa. Só alguns detalhes.
Como o software livre vai lidar com sistemasde proteção contra cópias dearquivos (DRMs)?Existe a chance de se adotar DRMs 'livres'?
É muito difícil. Temos de rechaçar completamente esta possibilidade. Nunca se deve comprar os produtos DRMs ou aceitá-los de presente. Isto é perder a liberdade. S.F.